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Subjetividades em tempos de Covid-19

Até pouco tempo atrás os atendimentos on-line eram exceção, em algum caso de mobilidade reduzida, um paciente atendido que viajava ou mudava de cidade e queria dar continuidade no seu tratamento ou ainda alguma demanda pontual de entrevistas na modalidade virtual. Hoje a situação mudou, e muito. Todos os tratamentos psicológicos são realizados pela internet devido à necessidade de isolamento social. O Conselho Federal de Psicologia teve que modificar suas Resoluções e Normativas para dar conta das mudanças advindas na sociedade.


A Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou no dia 11/03/2020 a pandemia da doença causada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2). Segundo o órgão, o número de pacientes infectados, de mortes e de países atingidos deve aumentar nos próximos dias e semanas. Para desacelerar o avanço do contágio e impedir que os sistemas de saúde entrem em colapso, a OMS instou os governos a promoverem as quarentenas preventivas(1). Desta maneira seguindo as orientações sanitárias, entre 50 e 60 % da população santista (São Paulo-Brasil) está em isolamento social voluntário. A totalidade das escolas Municipais e Particulares estão fechadas, algumas deram continuidade na modalidade de EAD (Educação a Distância), outras decidiram por antecipar as férias de julho. O UNICEF estima que na América Latina e no Caribe, mais de 154 milhões de crianças, cerca de 95% dos alunos matriculados na região, estão temporariamente fora da escola devido à Covid-19.(2) Foram considerados alguns serviços essenciais para permanecerem abertos para, desta maneira, garantir as necessidades básicas da população, como os serviços de saúde, desenvolvimento social e segurança pública, tomadas as devidas providências de acordo ao momento. Em alguns casos foram pensados esquemas de plantão, mesmo porque as equipes sofreram uma diminuição considerável devido ao fato de muitos funcionários serem considerados do grupo de risco (pessoas com mais de 60 anos, com doenças crônicas, mães que precisam cuidar de crianças pequenas ou quem tem no âmbito de sua convivência mais próxima uma pessoa com alguma comorbidade sensível ao agravamento dos sintomas) sendo permitido o trabalho na modalidade “home office”. Também os supermercados, padarias e farmácias permanecem abertos. As pessoas foram desencorajadas a procurar os serviços de saúde em caso de sintomas gripais leves e moderados, as consultas e procedimentos cirúrgicos eletivos foram suspensos ou adiados.


Enfim, a vida do modo como a conhecíamos não existe mais, por enquanto, e tem grandes chances de nunca mais ser como era. Todas estas mudanças geraram uma privação traumática, nosso mundo simbólico foi transbordado por uma realidade desconcertante, produzindo um sentimento de irrealidade. As representações de tempo e espaço mudaram. Para além das diferenças geográficas e socioeconômicas, esta pandemia nos igualou . Estamos todos no mesmo barco no meio de uma tempestade. Os parâmetros conhecidos sumiram. Aqui entra o aporte que a psicologia pode trazer neste momento de grande aumento da angústia frente ao desconhecido e a necessidade de subjetivar o que se nos impôs desde fora. A angústia pode ser um sinal de que algo não está bem ou pode devir acting out ou passajes ao ato, na forma de agressividade ou violência. Tem tido um aumento dos casos de violência doméstica em todo o mundo. A ONU realizou um documento no qual encontramos algumas orientações onde ressalta o cuidado com vítimas de violência doméstica nesses países. A ansiedade também afeta o corpo, com sintomas como a insônia, estresse, dor de cabeça, sintomas gastrointestinais e tristeza, podendo chegar a uma depressão. O isolamento social implica um luto, muitas perdas sofridas e que precisam serem elaboradas. O luto se processa em tempos: um primeiro tempo de impacto com forte carga emotiva e de surpresa frente às perdas. É comum nesta fase estarem presentes a negação, a tristeza, o arrependimento e a raiva. Um segundo tempo de compreender de que se trata, por palavras que expliquem de alguma maneira o que se sente. Fase da negociação e da barganha. Tempo de falar e escutar. Neste processo aparecem sentimentos depressivos, sensação de melancolia, impotência, desesperança e culpa.


É importante não negar o que se perdeu, as mudanças que se fazem necessárias e estar aberto à criatividade. Poder pensar novas maneiras de estar com os outros. Porque estar isolados não significa estar sozinho. A tecnologia está ai para nos ajudar a nos aproximarmos da família, amigos e companheiros de trabalho. Como lidar com a nova realidade, como organizar o tempo de modo a ter uma nova rotina, onde achar tempo para estar com outros.


O isolamento social encontra cada um num momento particular da vida, num determinado contexto socioeconômico e cultural, quem ficou junto e quem ficou afora? Estas diferenças precisam ser levadas em consideração para entender o momento de cada um. Não duvide de procurar ajuda de um profissional que o acompanhe nesta tarefa de ressignificação da vida, para que o Covid de lugar a Covida. Dentre a confusão sempre se está a tempo para dar lugar ao desejo.


Autor: Psicóloga Sandra Mariela Steinberg Gonzaga de Oliveira


Referências bibliográficas (1)(https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/03/11/oms-declara-pandemiade-coronavirus.ghtml) (2)(https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/covid-19-mais-de-95-porcento-das-criancas-fora-da-escola-na-america-latina-e-caribe ) (3)(https://catracalivre.com.br/cidadania/violencia-domestica-pode-aumentar-duranteisolamento-diz-onu/)

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